A mão de obra sempre foi desvalorizada no Brasil. Talvez, pelo
nosso longo histórico e costume de sermos explorados pelos outros países, passamos
a não valorizar uns aos outros.
Eu, que nunca gostei de ambientes cheios de pessoas banais fazendo
fofocas sobre a vida alheia em pleno horário de expediente, resolvi parar logo
em um salão de beleza com o mais variado tipo de gente. Claro que adoro sim me
sentar por algum tempo e manter uma conversa civilizada com uma ou duas
pessoas, mas aquela tagarelice à toa e que não leva a lugar algum, nunca
gostei. Não tenho paciência! Eu não perco mais tempo do que o suficiente pra
duas olhadas no meu esmalte desgastado. Foi-se a época que eu era bitolada na
chapinha.
No entanto, eu dou valor. Dou valor naquela que fica atrás de mim
queimando os dedos e lutando com pentes e escovas. Dou valor naquela que se
senta curvada e dá pinceladas de mestre em minhas unhas. E morro de raiva
quando alguém acha que entende alguma coisa do serviço do outro e começa a
comparar sua vida atribulada por médicos e esteticistas com as dores nas costas
da minha manicure. Fiquei
louca logo que ouvi:
- Levanta e dá uma alongadinha... – disse minha vizinha de cadeira
à minha manicure que reclamava um pouco da dor nas costas trazida pelo fim de
ano.
Como se alongar por dois segundos fosse resolver uma vida inteira
de pés e mãos pela frente. – pensei, mas não disse.
A moça ao meu lado era do tipo que trabalha nas horas vagas e não
o contrário. A sua manicure parecia um robô escutando as ladainhas de toda
semana, daquele mesmo horário, daquele mesmo lugar.
A minha manicure, por sua vez, ignorava e atendia o celular no
viva voz enquanto fazia notas mentais da matéria da aula anterior. Eu escolhia
a cor da vez, sem deixar de prestar atenção nos acontecimentos ao meu redor.
Ela (a minha manicure e não a engomadinha ao lado) não terminou o
colegial, mas ia terminar. Tinha bem mais anos do que eu e nem queria mesmo o
diploma. Queria que a filha, que cursava a quinta série, não tivesse a mãe como
mal exemplo. Fiquei interessada na história.
Desde os quatorze fazia unha, de casa em casa e então, nos salões.
Mas, você sabe. Aquele mesmo esquema da mão de obra que não te dá direito algum
à aposentadoria, décimo terceiro e férias. Aquele mesmo esquema sem carteira
que você paga uma porcentagem pelos gastos do estabelecimento e fica com o
resto. Aquele resto que ainda que fosse o total, não conseguiria pagar cada
sintoma da tendinite e problemas posturais.
Ainda tem gente que reclama do preço, reclama do serviço, reclama
se quem te atendeu fala demais, se fala pouco, se demora ou acaba rápido. Sem
falar nos pacotes, nas pedrarias e nas obras de arte em miniatura que as
madames adoram ostentar, mas pinicam o bolso quando um real de diferença é
somado na conta. Fica com pena e paga. Fica com pena, mas não volta mais. Parte
pra outra que cobra menos, que sofre mais. Até ficar com pena de novo.
E, sabe? Coitado é você. Você que veste sua máscara de compaixão moldada e encena em uma peça teatral que eu já cansei de ver. Se você reclama da educação e das poucas regalias que seu filho recebe dos outros por aí, cuidado. Você é quem pode estar contribuindo pra tudo isso. Quem tem não quer dar, mas é o primeiro a cobrar.
E, sabe? Coitado é você. Você que veste sua máscara de compaixão moldada e encena em uma peça teatral que eu já cansei de ver. Se você reclama da educação e das poucas regalias que seu filho recebe dos outros por aí, cuidado. Você é quem pode estar contribuindo pra tudo isso. Quem tem não quer dar, mas é o primeiro a cobrar.