Por que eu o ajudei?
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Por que eu o ajudei?
Acho que é essa a questão principal. Pensando sobre a atual situação não
financeira, mas de consciência social, eu questiono a vocês e a mim mesma. Por
que eu o ajudei e ainda sim sinto que nada fiz?
Voltando um pouco no
tempo, há quase dois anos atrás eu fui à Florianópolis passar as férias com meu
namorado. Era a primeira vez que ia à praia e a primeira vez que via um lugar
tão calmo e organizado. Apesar do movimento constante da ilha, as pessoas são
extremamente educadas... daquele tipo que param o carro para os pedestres
atravessarem. No entanto, o que de fato me chamou a atenção foi que numa cidade
turística somos acostumados a ver muitos mendigos e lá, não encontrei nenhum.
É claro que percebi a
diferente situação financeira dos moradores em determinados lugares, mas nenhum
que precisasse realmente de ajuda. Dessa vez, infelizmente, tive desagradável
surpresa.
Talvez pela crise do
país as coisas estejam ficando piores para algumas pessoas que já tinham pouca
estabilidade financeira. Mas, essa é só uma das verdades. O desalento, acredito
eu, seja o agente causador da maior parte dessa população menos favorecida
estar nessas condições agora.
Quando digo condições
quero chamar sua atenção não para o lugar em que a pessoa se encontra. O
morador de rua não sofre simplesmente por não ter onde morar, sofre por não se
encaixar em qualquer lugar que ofereçam para que ele more. É mais difícil de
resolver do que parece.
Aquele quem vos falo é
mais do que um morador de rua. É alguém com nome e uma história. Alguém que
caiu de tal altura que não conseguiu mais se levantar. Aquele quem eu ajudei
não me pediu uma moeda.
Eu estava caminhando já
tarde da noite com meu noivo (aquele que era namorado há quase dois anos atrás)
pelas lojinhas que acompanham a orla da praia. Então, esse senhor nos parou.
Quis falar, então falou. Disse que há muito não via um casal andando abraçado e
de fato não vi nenhum. Disse que as pessoas perderam a fé e vi no seu rosto que
sim, ele havia perdido a fé. Eu quis saber. Ele quis contar. Contou que a tinha
uma família, que a esposa o traíra, que perdera tudo, que ficou assim...
Perdido na vida e a vida perdida nele.
Me fez sentir desespero.
Uma vontade de mudar alguma coisa para que algo mudasse nele. Pediu um abraço.
Ganhou. Disse que estava com fome, nós lhe demos alguns trocados que juntando
com o que já tinha com certeza faria uma boa refeição.
Agradeceu. Se despediu.
E nós o vimos seguir para o mercadinho do outro lado da rua. Eu ainda não me
sentia bem, não queria parecer desconfiada ou mesmo invasiva. Mas, havia uma
sensação ruim de ter feito pouco. Queria fazer mais, chamá-lo para jantar,
deixá-lo escolher o que quisesse e lhe fazer companhia até que esse vazio desaparecesse.
Ao entrarmos no
restaurante para jantar, escolhi uma mesa bem próxima da porta esperando
revê-lo para poder o chamar se assim sentisse que devesse e ele aceitasse. No
entanto, a pequena sacolinha denunciou se não o caráter dele, a minha própria
falta de demonstração de afeto transformada no que o dinheiro pode comprar.
Comprou latinhas de
cerveja e seguiu para o lado contrário. Fiquei observando até sumir de vista.
Não o odiei por isso e nem por nenhum outro motivo. Simplesmente odiei a mim mesma
e a minha infelicidade. Não se pode comprar amor, companhia ou carinho. Não se
encontra nada disso nas prateleiras do mercadinho. A culpa é minha e dele.
Minha por não oferecer a ajuda correta e dele por não usar a minha ajuda de
forma correta. Eu não tenho a audácia de pensar que eu posso mudar o mundo com
minhas atitudes, mas sei que o mundo pode mudar se souber usar as minhas
atitudes. Eu tenho esperança que as verdades vão se alinhar num futuro e
ninguém mais precisará pedir por uma dose qualquer de amor ou álcool. Por hoje,
fico apenas com a mesma sensação de ter pisado sobre seus dedos enquanto me
pedia ajuda. Não, eu não o ajudei porque não entendi no momento o que
precisava, espero que encontre alguém que o faça.
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