E toda a minha sanidade foi varrida. Eu olhava para um ponto fixo
e só conseguia pensar no quanto as coisas pareciam não funcionar. Mas, eu não
queria pensar em nada. Eu sempre quis ver o final da história e nunca tive
paciência para ler devagar. Ah, mas quando não tinha solução eu lia, não
devagar. Lia e lia a todo o momento e adiantava algumas linhas pouco
interessantes. Consultava páginas à frente, só pra saber o que ia acontecer.
Em seriados era muito fácil pular alguns episódios e, por vezes,
ter que voltar para entender melhor. Podia saber do futuro e ainda sim, não
perder nenhum detalhe importante em minha curiosidade. Tudo acabava se
encaixando, e o fim, mesmo que distante, era conhecido. O sofrimento seria
esquecido e nunca mais retornaria para a vida dos protagonistas.
No entanto, no que diz respeito à vida real, eu ainda era a mesma
criatura ansiosa e preocupada. Não havia como adiantar partes, pular o
sofrimento ou ter a garantia do final feliz. E ainda, se chegasse a algum final
feliz, logo viria outro acontecimento que mudaria tudo e partiria então para o
próximo final feliz. Sabendo que final mesmo não existe na vida, o que existe
são as reticências.
O fim só seria real com a morte, porém, se todo o problema girava
em torno do sofrimento... Como morrer sem dor, sem o sofrimento que a antecede?
Como prever e com isso, escapar ileso?
Não haverá como. Decidi. É muito fácil viver de momentos. Amar
alguém porque em determinado momento ele foi perfeito, porque em determinado
momento ele te colocou em prioridade. É muito fácil amar alguém que em algum
momento te pegou nos braços e rodopiou com você na rua como louco, como se toda
a história não fosse importante. Somente um momento. Daí, você tem que juntar
na mente os fragmentos daquele momento e com eles, passar o resto da vida
feliz. Feliz com alguém que não foi nada mais do que um momento. Momentos
passam.
O príncipe encantado terá rugas por muito mais tempo do que teve
belos olhos, será enervante por muito mais tempo do que fez de tudo para lhe
agradar, reclamará do seu peso e dará mil desculpas para não ter que pegar sua
mão em público e você jamais saberá a história toda não seria mesmo importante.
Você vai duvidar. Vai duvidar da sua posição social, do seu
trabalho, dos seus amigos, da sua sanidade. Vai duvidar dos seus objetivos, dos
planos para alcançá-los, do dinheiro na conta, da felicidade que nunca bate na
porta. Vai dizer, se arrepender, pedir desculpas. Vai duvidar e nunca mais
pegar uma caneta na mão, escreverá e apagará enquanto for possível.
Eu lhe digo, a história toda é importante. Os detalhes são
importantes. O fim, por sua vez, se tem um ponto ou reticências, não é
importante. Se preocupar com aquilo que não está ao seu alcance e achar que
sabe de tudo e que pode controlar tudo, é errado. Não há como voltar atrás,
pausar ou pular etapas, não dá pra julgar o duvidoso sem arriscar. Não dá para
ficar o tempo todo só assistindo.